Dia mundial da população, Portugal e interior

José R. Pires Manso - Prof Catedrático. Universidade da Beira Interior. Responsável do Observatório para o Desenvolvimento Económico e Social (ODES)
Comemorou-se há poucos dias o dia mundial da população, por isso também o dia da população portuguesa que tem algumas características algo preocupantes para todo o país e também para o interior. Referimo-nos naturalmente à reduzida taxa de nascimentos, à baixa percentagem de jovens, à também reduzida população em idade ativa e à taxa elevadíssima de pessoas com mais de 65 anos (reformada), ao facto de o número de mortos superar o de nascimentos, e por aí fora, problemas particularmente mais graves no interior do país.

A população mais idosa em Portugal tem crescido mais de 2% ao ano, desde 2019, com o número de pessoas com 100 anos a ultrapassar já as 3.000 almas, segundo os dados divulgados pela Fundação Francisco Manuel dos Santos. “A população em Portugal está a envelhecer”, mostra a plataforma de estatística, referindo ainda que a idade mediana aumentou de 38,5 para 47 anos em duas décadas. Há mais de 2,5 milhões de pessoas com 65 ou mais anos (cerca de 25% do total). “O envelhecimento populacional verifica-se ainda no número de indivíduos em idade ativa por idoso pois há 2,6 ativos por cada idoso quando há 23 anos, no virar do século, eram quatro por cada idoso”, segundo a base de dados. Em termos concelhios há apenas dois com mais jovens do que idosos, Lagoa e Ribeira Grande, ambos na Região Autónoma dos Açores quando “há 10 anos, havia 36 municípios portugueses nessas condições”. O nosso país é o 2º da União Europeia (U.E.) com maior índice de envelhecimento e é o 4º do mundo com maior proporção de população idosa.

Da análise dos dados divulgados ressalta também que muitos portugueses vivem sós, que vivem “mais sozinhos” do que antigamente e até mais do que noutros países. De facto, há cada vez mais casais sem filhos e há mais de um milhão de pessoas a viver só. E destas pessoas, maioritariamente mulheres, que vivem sós, 55% são idosas, por isso se disse atrás que Portugal é agora o 4º país da E.U. com maior percentagem de idosos a viver só no total de pessoas nesta condição.

No que diz respeito a casamentos, eles são cada vez menos comuns entre os jovens portugueses, mas os casamentos celebrados entre estrangeiros quase triplicaram na última década (passaram de 767 em 2013 para 2.163 em 2023). Já o número de casamentos entre portugueses e estrangeiros aumentou 3 pp (pontos percentuais), representando agora cerca de 15% dos matrimónios no período (5.409 em 2023).

Os saldos migratórios (diferença entre pessoas que saem e as que entram em Portugal) quase duplicaram nos últimos dois anos. É oportuno referir que Portugal é um país muito desequilibrado com regiões do país superpovoadas, sobretudo nas zonas do litoral, outras medianamente povoadas, maioritariamente as capitais de distrito onde o Estado concentra alguns serviços (universidades, politécnicos, hospitais, tribunais, finanças, etc.), e ainda outras, a grande maioria, quase totalmente despovoadas na maior parte do país, sobretudo no interior, mas também nalgumas regiões do litoral. Esta situação afeta todo o país com meia dúzia de exceções.

Temos uma taxa de natalidade extremamente baixa, a segunda da EU, e uma das mais baixas no mundo. Com este desequilíbrio entre nascimentos (poucos) e mortes (muitas), não conseguimos assegurar a renovação de gerações para manter a população ao nível a que tem estado. De facto, até agora só tem aumentado alguma coisa, nos últimos tempos, à custa dos estrangeiros que vêm trabalhar para as estufas, a para a apanha da azeitona, da cereja e de outros frutos, para os serviços (neste caso, em particular os brasileiros), etc… Em suma, temos crescido um pouco, mas à custa dos imigrantes. Por isso costumamos dizer que no interior do país se fecham escolas primárias, em quase todo o país, e, em sua substituição, abrem-se Lares da terceira idade, residências ‘seniores’, centros de dia e/ou de noite.

Temos ainda uma faixa intermédia, em idade ativa, a reduzir-se gradualmente. E temos uma taxa de envelhecimento das maiores, o que coloca problemas graves ao orçamento (OGE), à saúde em geral, aos hospitais e aos centros de saúde (ULS, SNS), que não aguentam, e à Segurança social (SS), ADSE, entre outros.

A solução para resolver o problema de sustentabilidade da SS nomeadamente para pagar as pensões de reforma e outras prestações sociais tem sido baixar a percentagem das reformas de 100% iniciais para 90%->80%->70%-…, através de soluções mais ou menos engenhosas, soluções de que ninguém gosta mas que são as que se têm vindo a aplicar já que os descontos dos trabalhadores no ativo não são suficientes para assegurar os pagamentos mensais aos pensionistas. mantendo aquela percentagem do último vencimento constante. Outra solução também engenhosa, a da ADSE, foi aumentar os descontos para a ADSE como aconteceu no período da Troika em que a taxa passou de 0.5% para 3.5% do vencimento ilíquido do trabalhador, um aumento de 700%.

Mas esta situação causa também problemas às famílias, muitas das quais no litoral ou no estrangeiro, com os filhos a quase abandonarem os pais nas aldeias do interior, bem como nas suas vilas e até nas cidades. A solução tem sido construir lares ou residências séniores onde os alojar ou contratar gente para o fazer em casa – o que é difícil, delicado e caro –, ou descobrir outras soluções mais convidativas como entrar num sistema de co-building e sobretudo de co-living, de vivência em regime colaborativo, com apoio médico, de enfermagem, lavandarias e outros serviços, ainda pouco divulgado por cá, mas em franco desenvolvimento noutros país com maior poder de compra.

Enquanto isso, no interior do país, mais rural, e que viveu o maior surto emigratório da nossa história dos anos 1960 para cá, sobretudo para França mas também Alemanha, Países Baixos, Luxemburgo e Suíça, entre outros, e o consequente abandono dos campos do interior – que tradicionalmente abasteciam as zonas urbanas (cidades) – mas também com a saída de milhões para as metrópoles ou maiores cidades do litoral como Lisboa e Porto.

De facto, o interior perdeu grande parte da população, muita dela em idade ativa, perdeu nascimentos, perdeu  também os mais pequenos, as crianças, ficando apenas uma imensa população envelhecida, a tal que agora ocupa em exclusivo os lares da terceira idade/IPSS, tornando este sector social o maior empregador da maior parte dos municípios do interior, rivalizando neste domínio e na maior parte dos municípios, apenas com as autarquias.

 

Fontes: pt.knoema.com › atlas › Portugal, e www.pordata.pt › Portugal › Taxa bruta de natalidade

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