O artista tímido, mas desafiante

Francisco Silva posa com o seu retrato de Frank Ocean. Foto da autoria de Tomás Quaresma
Francisco Silva posa com o seu retrato de Frank Ocean. Foto da autoria de Tomás Quaresma
Estudante, de 23 anos, pessoa resguardada, gosta de desenhar nos tempos livres. Francisco Silva evita os holofotes, mas não hesita em espalhar a sua mensagem. Como fez na exposição ArtBeat, uma exposição sobre rappers, desenhados depois de absorver as emoções da música.

O dia estava chuvoso e escuro. No hall de entrada da Biblioteca Central da Universidade da Beira Interior (UBI), surge do exterior um rapaz com um chapéu de chuva preto enfiado num dos bolsos do seu casaco.

É relativamente alto e tem uma barba curta e bem trabalhada. No entanto, a sua postura é ligeiramente encurvada com os ombros fechados. Chama-se Francisco Silva, tem 23 anos, é da Guarda e está a estudar no curso de licenciatura com mestrado integrado de Arquitetura na UBI, com uma dissertação sobre maquetes.

Numa das mesas do segundo piso da Biblioteca, o único lugar silencioso que conseguimos encontrar para ter uma conversa, admite ser introvertido e um pouco tímido. Contudo, aceitou arriscar e realizar esta entrevista para “melhorar nesse aspeto”.

Sempre esteve ligado às artes, no entanto, dedica-se “principalmente ao desenho”. É uma ligação que nutre desde que era criança. “Quando entrei na escola primária, os meus avós ofereceram-me um caderno”, conta Francisco Silva, e foi a partir daí que começou a aprender a desenhar.

Dentro do desenho, optou pela esferográfica e pelo grafite, “dois materiais bastante opostos que se podem trabalhar de diferentes maneiras”, mas como gosta de desafios,  escolheu “principalmente a esferográfica”, uma técnica “mais difícil de ser trabalhada, por ser mais propícia a erros”.

Em foco nesta conversa esteve a exposição “ArtBeat”, que decorreu entre os dias  3 e 28 de fevereiro na Biblioteca Central. “A ideia surgiu durante uma palestra”, onde o desafio lhe foi lançado pela professora Patrícia Pedrosa, e a organização foi da trabalhadora do Setor de Difusão e Imagem da Biblioteca, Luísa Silveiro, sem a qual “não teria sido possível organizar esta exposição”.

O objetivo foi criar uma ligação entre a música e o desenho. Para tal decidiu desenhar o rosto de diversos artistas de que gosta. “Selecionei imagens impactantes dos artistas que escolhi”, impacto esse que sem a materialidade da esferográfica não seria possível. “Quando eu oiço a música deles, vejo um certo impacto que apenas a caneta tem no desenho”, explica o artista.

Alguns dos retratos de Francisco Silva que estiveram presentes na exposição “ArtBeat”. Foto da autoria de Tomás Quaresma.
Alguns dos retratos de Francisco Silva que estiveram presentes na exposição “ArtBeat”. Foto da autoria de Tomás Quaresma.

De dentro da mochila, retira alguns dos retratos: Kendrick Lamar, Tyler The Creator e Drake estão entre alguns dos vários artistas de renome ilustrados. Escolheu músicos mais recentes para criar uma ligação com os adolescentes e jovens adultos da Universidade. “A mensagem que tentei transmitir é que não devemos ter medo de fazer algo”, dá o exemplo do seu artista favorito, MF DOOM, que é alguém que “diz o que sente e não tem medo de mostrar a verdade”.

Apesar da essência da exposição estar nos músicos de Rap e Hip Hop, há sempre espaço para outras vertentes artísticas. “Já realizei vários retratos relacionados com o cinema, e gostaria de ligar o desenho com o desporto”, adianta. Um dos primeiros retratos que fez foi de Brian Cranson, o ator que desempenha o papel de Walter White (ou Heisenberg) na famosa série Breaking Bad: “esse desenho já é muito antigo, adorei a série e decidi arriscar”.

Nenhum artista carece de inspirações. Como principais influências aponta Jackson Pollock, “pela maneira  como tenta transmitir as mensagens da sua arte”, e Leonardo Da Vinci, “na forma de como trabalha o desenho”. “Acho que consigo encontrar um ponto de união entre dois artistas, que considero totalmente opostos”, sintetiza.

No tempo livre, para além de desenhar e ouvir música, Francisco Silva gosta de ler. “Um dos meus livros favoritos é o Bem Vindos a Joyland”, uma história de Stephen King, não de terror, mas sobre o crescimento e encontrar um significado na vida. “Sempre quis experimentar escultura”, mas até agora sempre ficou pelo “quis”, “talvez um dia”.

Prefere o silêncio para “aliviar a cabeça”, e sente-se melhor a fazer arte “em casa, longe das distrações e do barulho”. O seu processo criativo é simples, no caso dos artistas musicais começa “por ouvir alguns álbuns”, onde absorve as emoções que se estão a tentar transmitir e a partir daí começa a desenhar.

Fora de casa, evidentemente, opta por descontrair em locais que fomentam a imaginação e a ponderação. “Os meus sítios favoritos são o Jardim Público e o Jardim do Lago”, onde sente um certo aconchego e à vontade. “A Covilhã é uma cidade calma e acolhedora, que não é assim tão pequena como as pessoas dizem”.

Para o futuro, quer trabalhar principalmente na área da Arquitetura, mas não descarta a possibilidade de transformar este hobby em algo mais: “gostaria de tentar uma carreira na Arte do Desenho”.

Sketchbook de Francisco Silva que contem um retrato de Tyler da Creator. Foto da autoria de Tomás Quaresma.
Sketchbook de Francisco Silva que contem um retrato de Tyler da Creator. Foto da autoria de Tomás Quaresma.
Francisco Silva posa com um retrato de The Notorious B.I.G. Foto de Tomás Quaresma.
Francisco Silva posa com um retrato de The Notorious B.I.G. Foto de Tomás Quaresma.
Alguns retratos de Francisco Silva. Foto da autoria de Tomás Quaresma
Alguns retratos de Francisco Silva. Foto da autoria de Tomás Quaresma

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