Sporting Clube da Covilhã: 100 anos abraçados ao desejo da 1º liga

É uma história que confunde os laços familiares com o amor ao clube. Carlos Cruz tinha 6 anos quando se tornou sócio do Sporting Clube da Covilhã. Foi em 1948, há três quartos de século: “O meu pai, Ernesto Cruz, foi várias vezes presidente, e como gostava muito do clube, fez-me sócio e eu criei um sentimento forte pelo Sporting Clube da Covilhã”. O sentimento perdurou e Carlos Cruz é, hoje, o sócio número um do clube serrano. “É um privilégio enorme e, por vezes, as pessoas dão-me os parabéns e, sinceramente, sinto me extremamente orgulhoso por isso”, admite o covilhanense que, sempre que pode, procura “incentivar outras pessoas a tornarem-se sócias”.

O futebol marcou, definitivamente, a Covilhã dos anos 20 do século passado. Foi nessa década que começaram a aparecer grupos organizados como o “Montes Hermínios”, o “Victória Luso Sporting”; o “União Desportiva da Covilhã”, o “Estrela Football Club” e o “Grupo Desportivo Escola Industrial”. As equipas, na maioria dos casos, dedicavam-se à modalidade sem salário, depois de um dia de trabalho nas fábricas dos lanifícios espalhadas pelo concelho. O futebol era, à época, o retrato das desigualdades sociais: os clubes constituídos por operários subsistiam com grandes dificuldades financeiras, enquanto os clubes dirigidos por classes altas conseguiam ter meios para formar atletas.

 

 

É neste contexto que, em junho de 1923, o Sporting Clube da Covilhã nascia como a oitava filial do Sporting Clube de Portugal, composto por 70 sócios e presidido por José Jacinto Ferreiro.

 

As memórias de quem se dedicou ao clube

Ainda hoje Rui Morais se emociona com os momentos em que entrava em campo com as cores do Sporting Clube da Covilhã: “quando nos perfilávamos para entrar no relvado, tocava a música “Covilhã, cidade neve”, da Amália Rodrigues, e eu arrepiava-me sempre, todas a vezes”. Rui Morais tem no currículo o título de jogador que mais tempo alinhou pelo clube. Foram 13 anos como profissional, num estádio “mítico”, que considera “o Wembley da Serra da Estrela”.

 

Amália Rodrigues – Covilhã, Cidade neve – YouTube

Carlos Cruz também chegou a entrar em campo mas para dar os parabéns a alguns dos atletas e fazia-o com regularidade. “Havia um guarda-redes do SCC que era o Rita, era um grande guarda-redes, e havia outro que era o Ramalhoso, e já não me recordo em que ano foi, e ambos eram fabulosos, e eu por vezes chegava ao pé deles e dava-lhes os parabéns, porque as defesas que faziam eram de uma categoria, desde cambalhotas, a outros movimentos, que tornavam esses momentos deliciosos e inesquecíveis”, relembra.

A descida de divisão e “o melhor da vida”

Não é só de festa e de momentos bonitos que se faz história, Rui Morais lembra-se de uma em particular, que se tornou num dos momentos marcantes da sua vida, que relembra de forma emocionada “há um momento que particularmente me toca, que foi numa semana em que descemos de divisão, e que num sentimento que se tornou agridoce, por grande felicidade minha, a minha esposa ficou grávida da minha filha, que é o bem maior que eu tenho”.

 

As subidas de divisão

Numa história centenária, em que registou 15 épocas de primeira divisão, são os momentos dourados do clube. O s dias de hoje são bem distintos, num ano marcado pela descida à liga 3, almejar já uma subida de divisão era o melhor que poderia acontecer ao clube, e quem o diz é o presidente José Mendes, que recorda com nostalgia os melhores momentos que viveu no clube nestes 20 anos de mandato. “O que mais me marcou foram as subidas de divisão de 2004/2005, e 2007/2008”. Estas palavras, ditas com um brilho no olhar, por ver recompensado um trabalho de toda uma época, “foram inesquecíveis e marcantes. A energia que se sentia no clube e nos adeptos. Todo o esforço compensado foi gratificante”.

Rui Morais por sua vez, recorda momentos que jamais apagará a memória, e que ainda hoje o fazem sentir uma emoção que nem por palavras consegue exprimir: “Tive momentos de grande felicidade no clube, como subidas de divisão, que são momentos marcantes porque toda a gente fica feliz, vemos o trabalho de um ano inteiro ser recompensado no final de época, os adeptos festejam, e sendo covilhanense e este ser o meu clube do coração, ver amigos e conhecidos com uma alegria imensa foi maravilhoso”. Por entre memórias e alguma nostalgia, conta um momento caricato, que ainda hoje recorda com saudade: “Num jogo com o Ovarense no Santos Pinto em que se ganhássemos subíamos à 2ª liga, e isso de facto aconteceu, a euforia era tanta entre jogadores, staff e adeptos, que quando saí do estádio, bebi uma cerveja numa roulotte que estava no parque de estacionamento, e de seguida íamos ser recebidos na Camara Municipal para festejar na varanda e quando dei por mim estava completamente embriagado (risos), tal a euforia pelo sucesso”.

O momento atual

Um centenário não se conta só com momentos de glória, como foram as subidas de divisão, em finais de época. O atual momento do clube não combina com a festa dos 100 anos. A equipa principal desceu à liga 3, e para José Mendes o futebol é feito de alegrias e tristezas. “Nestes 100 anos o SCC andou a maior parte do tempo nos escalões abaixo da primeira liga, porque aí só esteve 15 vezes e portanto é mais um ano. Isto é o futebol, este ano tivemos a infelicidade de descer, mas é assim, há anos em que a bola bate na barra, o árbitro não assinala um penalti, ou é o jogador que o falha; agora cair na liga 3, torna-se muito mais difícil nesta altura, porque sem dinheiro não há hipótese, e como eu sou de boas contas e não dou o passo maior que a perna, não faço asneira, já chegou quando cheguei ao clube há 20 anos e este tinha um milhão de euros de dívidas”.

 

 

 

 

 

Por sua vez Rui Morais, ainda que com os pés assentes no chão e ciente das dificuldades, acredita que é possível o SCC almejar novamente aos campeonatos profissionais: “Não vai ser fácil, vai ser preciso investimento, porque nesta liga 3 já há boas equipas. Os bons jogadores custam muito dinheiro e infelizmente o SCC não tem as condições que merecia ter para se fazer uma aposta, para tentar colocar o clube no lugar que merece que é nos campeonatos profissionais”.

 

 

As ambições

O regresso aos tempos áureos é um desejo partilhado por sócios, adeptos e equipa técnica. Carlos Cruz verbaliza a ambição para a próxima temporada em poucas palavras: “devolver o clube à 2ª Liga”. O sócio número um do clube vai mais longe ao dizer que está convicto que “o clube vai dar a volta e vai conseguir chegar lá acima, inclusive à 1ª liga”.

O Presidente do Clube encara uma subida à 1ª liga neste momento como estando fora de questão e tira esse cenário de um futuro próximo, ao considerar que “é quase impossível nos dias que correm”, relembrando o ano de 2014, em que o clube “esteve quase a subir à 1ª Liga com o orçamento mais baixo do campeonato que, na altura, rondava os 500 mil euros, mas as Sociedades Anónimas vieram alterar tudo isto”. José Mendes admite que, no atual momento, “até para arranjar condições para se fazer uma boa equipa na 3ª liga vai ser difícil”. E por entre sonhos e desejos, alguns adeptos acreditavam que este ano seria o ano do SCC subir á primeira, este que é o desejo do Presidente do clube. “Falta subir à primeira liga, que é o meu desejo e o desejo de todos os sócios, mas para isso é preciso criar todas as condições, inclusive financeiras, para criar uma equipa de futebol que em vez de custar um milhão de euros, custe seis ou sete milhões e que com essa equipa exista quase a certeza que (independentemente de não haver certezas no futebol, porque há quem tenha esses orçamentos e não consiga) é possível realizar esse sonho”.

O atual momento coincide com o finalizar de um projeto, a bancada lateral do Estádio Santos Pinto. E mesmo numa época em que desportivamente as coisas não correram bem, José Mendes congratula-se, e ao mesmo tempo afirma que a cereja no topo do bolo seria a 1ª liga, mas que dificilmente se conseguirá esse objetivo. Por entre objetivos, e desejos, uma prioridade e sempre em prol do clube que ama “Sou uma pessoa que me orgulho de deixar obra feita, e portanto isso fala por si”. Num momento de menor felicidade para o clube, assume que a porta estará sempre aberta para aqueles que como ele amem incondicionalmente o Sporting Clube da Covilhã: “Quem ama e quem gosta do clube que viva apaixonadamente os jogos, que venha ao estádio, que apoie a equipa nos momentos mais difíceis, pois é sempre nesses que o clube mais precisa. Enquanto eu for presidente, estou sempre aberto a conversar para tudo o que for para construir. Quem gosta do clube como eu que o amo, e que morro pelo clube se for preciso, esses sócios queremo-los cá sempre e podem ter a certeza que serão sempre bem-recebidos enquanto eu cá estiver”.

 

 

 

 

 

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