Fundado em 2010 por Sérgio Ferraz, o Penta Clube da Covilhã (PCC) é uma referência local na esfera desportiva, a contar com dezenas de atletas federados e não federados, tanto no pentatlo moderno, como no triatlo, tiro, natação, esgrima, atletismo, entre outros. Em seu histórico, há campeões distritais, nacionais e internacionais, que demonstraram o valor do interior do país nas mais variadas provas. O Complexo Desportivo da Covilhã oferece estrutura suficiente para os treinos, dispondo de uma pista com oito raias em piso sintético, onde pessoas a partir dos cinco anos de idade podem juntar-se ao Penta Clube da Covilhã e construir seu caminho atlético.

No início, era obrigatório fazer as cinco modalidades do pentatlo para poder pertencer ao PCC, porém, a demanda foi tanta que o clube precisou adaptar-se e criar mais secções. Nuno Gravito, presidente da associação, começou como coordenador técnico da equipa de treinadores do clube em 2014, e desde o ano seguinte, está na presidência. Enxerga o PCC como um “projeto diferenciador”, por uma série de fatores, como ser o único clube a nível regional a desenvolver o desporto adaptado no atletismo, e serem pioneiros na cidade na modalidade trail, além de serem uma das poucas agremiações desportivas na região a irem a competições de montanha, e recentemente, conseguindo o título de campeões nacionais de montanha nos júniores feminino e o bronze nos júniores masculino. O presidente destacou a participação de seus atletas no “Torneio Nacional Olímpico Jovem” tratado com grande importância, por ser uma grande oportunidade para os jovens evoluírem e conseguirem maior visibilidade.
O que diferencia o PCC de outros clubes, segundo Nuno Gravito, também é o facto de estarem inscritos em sete federações diferentes, chamando a atenção da diversidade que o clube promove. Tamanho cuidado em ofertar o desporto, fez do Penta Clube da Covilhã acabar por revelar atletas que chegaram a pertencer às seleções nacionais de marcha atlética, de montanha, Skyrunning, Pentatlo moderno e Laser Run. “Nós somos o clube que na cidade, conquista mais títulos nacionais e com a maior participação internacional” reforça o presidente do clube.

Embora tenham boas condições para treinar, Nuno Gravito aponta como dificuldade o facto de as infraestruturas não serem próprias, mas sim cedidas, o que faz com que estejam sujeitos, a todo o momento, ao trabalho de outras entidades, ocasionando o impedimento de conseguir angariar mais atletas, devido também à falta de espaço. Perguntado sobre viver de modalidades alternativas ao desporto mais popular, o futebol, o dirigente diz que é um “desafio diário”, ressaltando que o atletismo por exemplo, em poucos casos, consegue ser uma atividade profissional, sendo mais difícil cativar as pessoas a realizá-lo, mesmo sendo um desporto que possui uma certa facilidade de praticar.
O presidente do Penta Clube da Covilhã, entende que o clube evoluiu bastante ao longo dos anos, pontuando que o financiamento da instituição deu um salto de cinco mil euros para 26 mil euros anuais, e está investindo muito no desporto feminino, projetando que o clube irá crescer na organização administrativa e ao nível da profissionalização de seu setor técnico.
O título mundial é de Amaro Teixeira
Uma figura importante do PCC é o treinador da secção de atletismo, Amaro Teixeira que, há pouco tempo, alcançou o título mundial de marcha atlética de pista coberta na categoria dos veteranos (35 anos em diante), competição essa que foi realizada na Flórida, nos EUA, reunindo milhares de competidores. Muito antes dessa conquista, Amaro Teixeira, açoriano, que já mora na Covilhã há mais de quinze anos, conquistou o grau de Mestre em Ciências do Desporto na Universidade da Beira Interior, e em seu período universitário, começou a fazer corridas de resistência, e quando já estava no mestrado, experimentou a marcha atlética, de início apenas para dar pontos para universidade e “tapar o buraco”. Desde 2010, é tanto atleta como treinador e foi em 2014 que Amaro e o PCC se uniram.
O treinador e atleta foi homenageado esse ano pela União das Freguesias de Covilhã e Canhoso por sua carreira, e comentou sobre a sua dedicação de conciliar a vida de atleta, treinador e rececionista de hotel como trabalho noturno, o que atrapalha seu momento de sono e repouso, mas mesmo assim, consegue equilibrar suas responsabilidades, que também envolvem outras funções no clube, como procedimentos de inscrições de atletas e organização das deslocações para as provas. Embora viver apenas do atletismo ainda não seja uma realidade na vida de Amaro Teixeira, o desportista manifestou o quanto aprecia e valoriza trabalhar com o desporto, o que o fez atingir o recorde nacional universitário ainda vigente de 10 quilómetros de marcha, com o tempo de 44 minutos e 54 segundos, e posteriormente outros resultados importantes, sendo o último um título mundial. Nesse campeonato em questão, para Amaro poder representar Portugal, precisou de se inscrever e arcar com todos os custos, e no fim, essa aventura o conduziu até o lugar mais alto do pódio e à oportunidade de ouvir o hino português.

O treinador pretende participar de outros campeonatos internacionais, após o vice-campeonato mundial em 2024 na Suécia, e a medalha de ouro na Flórida este ano. Depois de acompanhar alguns treinos no Complexo Desportivo, foi possível notar um clima leve, e embora sejam modalidades individuais, perceber um espírito de equipa aflorado no Penta Clube da Covilhã, e que explica muito o sucesso que o clube vem tendo.
Quando o atletismo acelera o ritmo da solidariedade
Houve também outra pessoa que deixou sua terra e veio parar na Covilhã, para estudar na UBI, o enfermeiro e estudante de mestrado em Psicologia, Duarte Gil Ribeiro Barbosa, natural do concelho de Paredes, com passagem pelo Hospital Universitário de São João no Porto, onde trabalhou como enfermeiro por mais de 25 anos e que atualmente exerce essa função na Unidade Local de Saúde Cova da Beira. Sua história no atletismo começou aos 16 anos, por lazer, até que passou a participar de competições mais desafiadoras como meias-maratonas. Duarte Gil contou que o seu impulso para ajudar as pessoas se deu por uma situação em sua família. Uma prima deu à luz uma criança com paralisia cerebral, e sentiu o dever de ajudá-los de alguma forma. Foi então que, em 2015, teve a ideia de juntar o atletismo a um evento solidário, inspirado na prova internacional “24 horas de Portugal”, que consistia correr em circuito durante um dia inteiro, e o vencedor era quem corresse mais quilómetros. O enfermeiro pensou em fazer algo parecido, com o asterisco de que, a cada quilómetro que completasse, daria um euro à sua prima para ajudar com a fisioterapia. No entanto, sua prima, expressou a vontade de que, em vez do dinheiro ir para ela, fosse para a Associação do Porto de Paralisia Cerebral (APPC), na qual o seu filho foi acolhido. “Falei com a instituição (APPC), fiz a proposta, e eles disseram que eu era louco” disse Duarte Gil Barbosa, pelo motivo de não o conhecerem, falando que só pediu que a instituição fizesse a publicidade, e o restante o atleta prepararia, o que demorou um ano.
Em setembro de 2016, o evento solidário aconteceu, tratando-se de um percurso de dois quilómetros em um parque no Porto, que reuniu centenas de atletas que correram com o mesmo objetivo. O resultado no fim daquele dia, foi a angariação de quase dois mil euros de fundo para a APPC, e foi a primeira vez que um evento solidário nesse estilo ocorreu no país. Duarte, a partir daí, motivou-se a continuar realizando esses tipos de eventos. O facto de ser profissional de saúde, ajuda em toda a sua preparação para percorrer longas distâncias, fazendo isso por simplesmente lazer, não desejando ser profissional, afirmando: “Sempre gostei de ser livre”, interiorizando esta filosofia da liberdade de poder decidir suas próprias metas. A partir disso, seguiu seu caminho de utilizar o desporto como instrumento para ajudar a sociedade, proporcionando a participação da atleta Fernanda Ribeiro em um evento seu em 2017. O enfermeiro ao longo de sua vida, já correu muitas maratonas, explicando que em determinado momento o atleta entra em “piloto automático”, por exigir muito foco para atingir o objetivo final, ainda mais quando, no caso de Duarte, se comprometia com a comunicação social, prometendo que iria correr 200 quilómetros em 24 horas, sentindo que era uma obrigatoriedade cumprir com sua palavra.
Em alusão à preparação para fazer provas tão difíceis, Duarte referiu que “não se pode cortar caminho”, ou seja, queimar etapas, pois antes de qualquer coisa, se deve adaptar o corpo à corrida e, também, ser resistente a tudo que possa a vir acontecer numa corrida. O atleta já passou por situações complexas, como completar metade de um percurso de dez quilómetros descalço em Baião, por suas sapatilhas terem ficado sem a sola, e numa outra situação, ter feito uma corrida no Porto de mesma distância, mas fantasiado e maquilhado, criando o personagem “Mimo”, que futuramente, voltou a ser interpretado na prova dos 100 quilómetros da Serra da Freita, com sete mil metros de desnível acumulado. Essa prova foi marcada pelo calor, que fez com que começasse a entrar tinta no olho de Duarte, comprometendo sua visão naquele momento, mais especificamente, às três da manhã, precisando esperar que um atleta vindo de trás o ajudasse, guiando até o fim da corrida, nos últimos 20 quilómetros. Felizmente, o enfermeiro não ficou com sequelas graves, depois de ter ido para o hospital fazer a limpeza dos olhos. Duarte Gil Barbosa igualmente chegou a correr debaixo de forte chuva e frio, e até mesmo com neve, dizendo que considera correr com o clima mais quente, mais desafiador do que em temperaturas baixas, em seu caso particular.
Embora seja complicado levar a vida de enfermeiro e atleta, Duarte Gil Barbosa teve 20 anos de atletismo, e inúmeras corridas em Portugal, além de correr em outros países como Espanha, França, Suíça, Alemanha e Austrália. Na famigerada maratona de Berlim, o enfermeiro conseguiu, numa determinada edição, o feito de terminar à frente de dois atletas quenianos apontados como favoritos, que acabaram por desistir durante a corrida. Perguntado sobre recordes que guarda com carinho na memória, o atleta destacou a sua marca pessoal de 33 minutos e 20 segundos nos dez quilómetros, e os 225 quilómetros percorridos em 25 horas no ano de 2020. Com tantas experiências em corridas, inevitavelmente algumas lesões sucederam, e uma delas é a razão de Duarte não estar a correr por enquanto, já que precisa realizar um procedimento cirúrgico na anca. No futuro, quando estiver recuperado, com mais tempo, e melhor financeiramente, tem a vontade de dar a volta ao mundo caminhando, em um outro evento solidário.

Da dança, aos 40 atletas para treinar
Indo para o Fundão, encontramos o Grupo de Convívio e Amizade nas Donas, existente desde 1989 – é uma associação sem fins lucrativos, que promove a prática de atividades saudáveis, como o desporto. O GCA Donas tem tradição no atletismo, evidenciado por exemplo no Olímpico Jovem Nacional de 2025, onde a atleta Madalena Silva virou campeã no salto em altura. Treinador de atletismo do grupo, Fábio Barata começou sua vida desportiva, primeiramente na dança no seu nono ano escolar, seguindo para a ginástica acrobática, e enfim, o atletismo em 2010, passando a ser treinador em 2015, e no ano seguinte, chegou ao Fundão aos 23 anos. Suas conquistas incluem ter conseguido atletas que disputaram campeonatos europeus, um de montanha em 2018, e um no de pista de juniores em 2023. Atualmente, Fábio treina 40 atletas, desde benjamins aos séniores, com treinos de segunda à sábado na pista do Agrupamento de Escolas do Fundão, que não possui as medidas oficiais e tem problemas com buracos e outras irregularidades que atrapalham no dia a dia. “Em termos de apoio financeiro, e em termos de condições de treino, estamos sempre um bocadinho aquém do que é necessário”, sublinha Fábio Barata, sublinhando que o entusiasmo persiste: “É um orgulho enorme estar numa modalidade amadora e conseguir fazer o que nós fazemos”. Há muitos anos, o GCA Donas passou a apostar ainda mais na formação, que resultou na conquista do prémio “Atleta Completo Nacional” no ano de 2021, uma competição nacional de clubes, que funciona num sistema de pontos.
O treinador enxerga como uma grande complicação, o facto de ter de fazer muitas coisas sozinho, desde o planeamento de treinos até a parte de secretariado, inspeções e avaliações. A essas, somam-se outras dificuldades: mato em volta da pista, que às vezes faz perder os discos de arremesso dos treinos, e a areia do salto em distância, que de vez em quando, é alvo das necessidades dos gatos. Fábio Barata revelou que a pista ao ar livre em que treinam, desde sua vinda, nunca passou por reforma. Apesar das condições não serem as melhores, o GCA Donas continua a formar atletas que costumam ter destaque em competições nacionais. Se nessas circunstâncias mais precárias o grupo já consegue obter bons resultados, com mais apoio, teria ainda mais potencial.

Portugal já deixou marca, mas o caminho é longo
Sem dúvidas, o atletismo é um desporto que levou o nome de Portugal mundo a fora, desde a primeira medalha de ouro na modalidade obtida em 1960, por Pedro Almeida no salto em comprimento, na primeira edição dos Jogos Ibero-Americanos, realizada em Santiago no Chile, até ao presente. São já 13 medalhas olímpicas, que incluem os cinco “ouros portugueses” na maior competição desportiva do mundo. O reconhecimento não acompanha essa jornada, podendo ser visto nos números de distribuição do financiamento do governo face às federações desportivas, relacionado com o crescimento nas apostas online, logo, por cada quatro euros destinados ao desporto, três são atribuídos ao futebol, enquanto o euro restante é partilhado entre mais de 60 outras modalidades desportivas. De acordo com dados fornecidos pelo próprio governo no ano passado, referentes a 2023, o total do valor a ser repartido foi de 66,9 milhões de euros, dos quais 75% ficaram na Federação Portuguesa de Futebol e na Liga de Futebol, e a Federação Portuguesa de Atletismo apenas recebeu 580 euros.


Em 2025, a Federação Portuguesa de Atletismo (FPA), anunciou a “licença para correr”, uma medida que deve entrar em vigor a partir de outubro deste ano, que irá fazer com que, atletas com mais de 18 anos, que não são federados, tenham de pagar uma licença para participar em provas de corrida organizadas, reconhecidas pela FPA. Esta licença será obrigatória para eventos com um custo de inscrição superior a cinco euros, e o valor a pagar pela licença pode mudar dependendo da forma de pagamento escolhida. O presidente Nuno Gravito, do Penta Clube da Covilhã, discorda da nova licença. “Acho que é uma medida mais comercial, e para gerar frutos para a própria federação, do que propriamente para beneficiar o atleta”, disse o presidente, comentando sobre o outro obstáculo que está a rondar o atletismo no país.
E se é certo que o atletismo está a sobreviver diante de tantos problemas, a região da Beira Interior segue sendo uma referência em âmbito nacional, com seus clubes, como o PCC, Estrela Campo de Aviação, GCA Donas, C.C.D Leões da Floresta e o Grupo Desportivo da Mata. O caminho ainda é longo, pensando numa melhor estruturação do atletismo em Portugal, mas a esperança segue viva nos atletas e nos clubes da região.