Luís e Sandra Bordalo: De lisboetas a guardiões dos animais em Belmonte

A história do Monte da Farrusca é muito mais do que a simples fundação de uma associação de bem-estar animal. É o testemunho da profunda transformação de um casal, Luís e Sandra Bordalo, que, ao trocar a vida agitada de Lisboa pela serenidade de Monte do Bispo, no concelho de Belmonte, em 2023, descobriu uma missão inesperada e urgente.

Uma gata, vinda da propriedade de um vizinho idoso, começou a procurar alimento no quintal dos Bordalo, foi a instigadora de tudo. “A culpada é a Farrusca, que era de um vizinho nosso que adoeceu, uma pessoa já com uma certa idade, e desceu ao nosso quintal em busca de comida. E nós começamos a partilhar com ela os nossos restinhos e as nossas coisas” – confessou Luís.

A situação evoluiu rapidamente. Farrusca não só encontrou guarida como também deu à luz uma ninhada de quatro gatinhos, seguida, pouco tempo depois, por outra. Este contacto direto com a realidade da reprodução descontrolada de animais despertou em Luís e Sandra uma consciência aguda para um problema que até então lhes passara despercebido. Vindo de um ambiente urbano onde estas questões não eram tão evidentes, o casal confrontou-se com a necessidade de agir.

O nome “Monte da Farrusca” surgiu como uma homenagem natural à gata que desencadeou esta mudança de rumo nas suas vidas. O que começou como um ato isolado de caridade transformou-se numa dedicação constante. A sua casa e arredores passaram a acolher um número crescente de felinos – “12 neste momento. E na parte de fora de casa temos mais uns 15, 16. Vão variando consoante vão trazendo os amigos”.

Inicialmente, a intervenção de Luís e Sandra passava por alertar as autoridades locais relativamente às colónias de animais descontroladas. Através do contacto com a Câmara Municipal e a veterinária municipal, procuravam identificar estas colónias para que fossem implementadas as medidas legais, como a captura, esterilização e devolução dos animais.

No entanto, a sua ação foi para além de apenas reportar as situações. A preocupação em garantir o bem-estar dos animais levou-os a contactar clínicas veterinárias para fornecer esterilização, vacinação e desparasitação, investindo dos seus próprios recursos. A perceção de que o problema era vasto e a identificação com outros cuidadores na comunidade impulsionaram a ideia de criar algo mais estruturado. A experiência com a APAAE (Associação de Proteção e Apoio ao Animal) em Castelo Branco, uma associação com uma clínica veterinária que lhes ofereceu preços mais justos para esterilizações em massa, foi uma influência significativa.

A formalização do Monte da Farrusca como associação em novembro de 2023 surgiu da necessidade de dar mais sustentabilidade ao seu trabalho voluntário e de criar um canal transparente para as doações que começaram a receber. Pessoas sensibilizadas com a sua causa ofereciam mantas, comida e apoio financeiro, e a associação surgiu como forma de gerir estes recursos de forma organizada e poder prestar contas.

Apesar do trabalho voluntário intenso, que envolve desde levar animais ao veterinário até limpar as áreas onde vivem as colónias, Luís e Sandra sentem que contribuem para a sociedade. A sua ação vai além do controlo populacional e do bem-estar dos animais, tendo também um impacto na saúde pública e na qualidade de vida da comunidade. Através da socialização dos animais resgatados, preparam-nos para a adoção, proporcionando companhia e alegria a novas famílias. Acreditam que a sensibilização das novas gerações é crucial para mudar algumas mentalidades e evitar práticas menos corretas contra os felinos.

Os Bordalo procuram também integrar a sua paixão pelos animais com uma visão de sustentabilidade ambiental, reaproveitando os dejetos dos gatos para compostagem na sua horta. Este ciclo de aproveitamento reflete a sua filosofia de minimizar o desperdício e valorizar os recursos disponíveis.

Apesar dos desafios, como a burocracia e a necessidade de sensibilizar mais pessoas para a causa, Luís e Sandra Bordalo, através do Monte da Farrusca, continuam o seu trabalho com dedicação e esperança de construir uma comunidade mais consciente e compassiva para com os animais. A sua história é um exemplo de como uma mudança de vida inesperada pode levar a um impacto profundo e positivo na sua comunidade.

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