Mais que uma dança, o folclore é uma paixão

É um dos grupos de rancho folclórico da região flaviense com mais jovens, das mais diversas idades, entre os cinco e dezoito anos de idade. E foi um dos poucos que se manteve ativo após a pandemia de Covid-19.

Entre tradições, o rancho folclórico é uma das que se tenta manter viva na cidade de Chaves. O grupo “Vila Medieval de Santo Estêvão”, que começou em 1997 com “uma brincadeira entre família na aldeia”, junta hoje cerca de 40 pessoas, entre as quais idosos que transmitem conhecimentos geracionais para adultos e crianças.

Há quem cante, há quem dance e há quem toque um instrumento. Mas todos estão unidos para um único propósito: preservar a cultura popular. Mas não é só com as cantorias, é também através das roupas que “além de serem pobres”, retratam a região de Trás-os-Montes, as gentes a as profissões dos antepassados. Cada pessoa que “traz uma roupa e enverga um traje” representa trabalhadores do campo, como os ceifeiros, os pastores, os jeireiros, as leiteiras, as fiadeiras e as lavadeiras. A ceifeira era uma mulher bonita que acabava por ser namorada pelos homens que iam ceifar o trigo ou o centeio. Já a lavadeira lavava a roupa, numa tábua de pedra, no rio Tâmega ou nos lavadouros e, muitas vezes, como tinha dois namorados, que não sabiam um do outro, acabava por haver uma luta para determinar quem conquistava a mulher.

Algumas das músicas do repertório do grupo são do Cancioneiro Português, mas a maioria retrata “tudo de bom que tem a região”, desde o gastronómico até ao cultural, com a ajuda da concertina, da guitarra, da pandeireta, do bombo, do reco-reco e do triângulo.

Noémia Pereira é uma das “iniciantes”, por causa da mãe e dos irmãos, que já integravam o grupo. Além de presidente, foi onde conheceu o marido. Com o tempo foi “apanhando o gosto” e essa tradição foi também transmitida aos dois filhos, um de 16 e outro de 11 anos, que desde pequeninos começaram a dançar “até acharem piada”.

O mesmo se passou com Liliana Rodrigues, uma das jovens que integrou no grupo ao assistir a um único ensaio e cujo “bichinho” pelo rancho persiste desde pequena quando via as danças na televisão. Embora muitos julguem quem faz parte de grupos de folclore, por terem roupas antigas, para Liliana trazem “um sentimento especial que mostra claramente o que era o antigamente”. À semelhança da jovem, também o veterano Filipe Carvalho, que faz parte do grupo desde que praticamente foi fundado, diz que refletem os usos e costumes da cultura flaviense e portuguesa.

“Se falarmos em rancho, muitas pessoas, principalmente, os mais novos acham parolo. Dizem que andar no rancho é uma parolice. E muitos nem conhecem”.

Além disso, Filipe acredita que “é muito difícil chamar pela rapaziada mais nova”, às vezes, pela vergonha, outras vezes pelo receio de serem vistos com “maus olhos”. E, por isso, o rancho folclórico prende mais mulheres.

Manter a tradição não é um mar de rosas. Fazem “o rancho a custo zero”, pelo facto de os apoios serem cada vez menores e de tempos a tempos terem de despender o próprio dinheiro. Muito do valor que angariam é com atuações, o qual reverte para trajes, manutenção de instrumentos e para alguma alimentação. “A sorte” é o espaço não ser uma dificuldade. Mesmo ninguém da equipa sendo da freguesia de Vale de Anta, a Junta de Freguesia disponibiliza, desde há vinte anos, o espaço para todos os ensaios.

Margarida Pio, que assume o papel de noiva nas danças, explica que quem passa pelo rancho “fica por uma razão”. Além do folclore, fazem convívios e para muitos é um “bocadinho de sexta-feira” que não só ajuda a aliviar o estresse do dia-a-dia, mas que ainda dá mais força para a semana seguinte. Apesar de “a rotina ser uma espécie de prisão” que leva a que quase todos estejam constantemente atarefados, quem trabalha ou quem estuda, faz sempre um esforço para ter um tempinho dedicado exclusivamente ao folclore.

 

O que é certo é que percorrem o país de norte a sul, além das ilhas. Para lá das atuações na cidade flaviense, todos os anos pisam os palcos do país e do mundo, através de um festival que organizam e no qual convidam grupos de rancho de várias zonas do país. Há dois anos passaram por Tui, em Espanha, e este ano vão até Aveiro e à Madeira.

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