No dia 27 de maio, famílias e profissionais da educação comemoraram o Dia Internacional do Brincar tendo por mote a defesa da atividade como “uma ferramenta fundamental para mudar o futuro”. A convite do projeto Eu Sou+, da Câmara Municipal da Covilhã, Carlos Neto transmitiu ao público a sua experiência de quase cinco décadas centrada no papel do brincar e do jogo no desenvolvimento da criança, na independência de mobilidade em crianças e jovens e no bullying nas escolas.
Para o professor, especialista em motricidade humana, “brincar é ser ativo” e requer liberdade para explorar a natureza, subir às árvores e mexer em terra e lama, para que a infância seja saudável e natural. Entre as propostas que trouxe à Covilhã está a adaptação dos espaços para criar condições e contextos para as crianças se auto organizarem e brincarem de forma autônoma.
“Limitar a mobilidade de uma criança é um crime” para Carlos Neto. Crítico do modelo tradicional de escolas limitado às quatro paredes da sala de aula, o professor propõe “escolas mais humanas, democráticas e participativas”, que devolvam a natureza às crianças a fim de que tenham “um corpo ativo e contemplativo, capaz de observar e aprender em lugares mais interessantes”.
Júlia Rebelo, técnica de ação educativa no Centro de Assistência Social do Tortosendo, trabalha com crianças dos 09 aos 14 meses e reconhece a dificuldade em aplicar o conhecimento partilhado na palestra. “Às vezes não somos nós que não queremos libertar e deixar brincar as crianças, são os próprios pais que nos impõem esses medos”. Apesar disso, o receio e a preocupação com pequenos acidentes expressos pelos pais não impedem Júlia de persistir no seu desejo de “deixar as crianças explorarem, viverem e brincarem mais”.
Presentes com seus três filhos durante todo o evento, Ricardo e Ana Baptista afirmam ser possível colocar em prática muito do que foi dito por Carlos Neto. “Na parte de natureza, sim, nós tentamos aplicar com os nossos filhos”, comenta a professora de yoga. O professor do ensino secundário incentiva os filhos a subirem em rochas e a explorar a natureza, “trabalhando a motricidade grossa e deixando-os correr riscos para que saibam o que fazer com o corpo”.
Para a professora de yoga, estar num ambiente natural e permitir que os seus filhos corram riscos transformou a sua relação com eles. Uma vez por mês, participa de “uma pequena ilha verde”, um encontro de famílias que proporciona vivências de yoga e atividades baseadas na Escola da Floresta – modelo de educação ao ar livre desenvolvido em países escandinavos desde 1950. A iniciativa acontece há um ano no Parque do Convento do Fundão e no Ananda Valley, no Paul. “Isto começou porque o Leonardo, meu filho, é mais agitado e sempre que vai à natureza fica muito mais leve”, diz Ana. Segundo ela, as atividades geram um impacto positivo sobre a inteligência corporal e refletem na relação da mãe com os filhos, “Se eu permito que eles corram riscos, eu lido também com os meus sentimentos, com as minhas emoções e com os meus medos. É como se eu servisse de modelo para eles.”
Fora do ambiente natural também há alternativas para as atividades lúdicas, como mostra Ilda Vaz na oficina de construção de brinquedos com bonecas de trapos. O resgate das brincadeiras que fizeram parte da infância de Gu Robalo foi uma oportunidade “fantástica” para estar com a filha Vitória Esteves e a neta Aurora. Enquanto dividia a atenção entre o bebé e os trapos, Vitória confessou ser a primeira vez que costura a própria boneca, “brincadeiras assim não acontecem com muita frequência, apenas se provocadas, como está a acontecer agora”.