Abril na Covilhã: cravos, vozes e futuro

A Covilhã encheu-se de cravos, vozes e memória na noite de 24 de abril. As ruas vibraram com a mesma chama que, há 50 anos, acendeu a esperança de um país livre. “A Noite e a Madrugada”, como foi chamada a programação oficial, começou às 21h00 com a já tradicional Arruada da Liberdade, liderada pela Banda da Covilhã, que percorreu a Rua Direita ao som de “Grândola, Vila Morena”. A canção-senha da Revolução voltou a ecoar entre as paredes de pedra e história da cidade, arrastando atrás de si um mar de gente.

Cartazes erguidos ao alto marcavam o compasso das palavras que não se esquecem: “25 de Abril sempre, fascismo nunca mais”, gritavam alguns. Outros lembravam as lutas de hoje, como o grupo de professores que marchava com cartazes contra a precariedade, ou um grupo pacifista com palavras simples, mas urgentes: “Paz sim, guerra não!”.

“É bonito ver que o espírito de Abril não é só memória, é também ação. Há 50 anos, lutávamos por liberdade. Hoje, lutamos para mantê-la e ampliá-la”, partilhou Luísa Mendes, 24 anos, estudante de Ciências Políticas, enquanto segurava uma rosa vermelha improvisada num lápis.

Depois da arruada, as pessoas concentraram-se no Pelourinho ao som da Banda da Covilhã, e logo a seguir iniciou-se o programa cultural na Praça do Município. Subiram ao palco os músicos do projeto Mata Con’Vida e, mais tarde, Luís Portugal apresentou o espetáculo “De A a Z – De Adriano a Zeca”, um tributo comovente às vozes da resistência. A multidão acompanhou com atenção, entre refrões conhecidos e aplausos sentidos.

À meia-noite em ponto, o céu abriu-se em cor e som. Um espetáculo de fogo-de-artifício longo e intenso cobriu a Praça do Município, deixando crianças boquiabertas nos ombros dos pais e lágrimas discretas em rostos mais velhos.

“Faltou a Grândola à meia-noite. Costumava ser o auge, cantada por todos. Este ano não a puseram”, lamentava António Santos, 67 anos, que fez questão de vir desde Tortosendo para “reviver a noite em que tudo mudou”.

Mesmo sem a canção final, o espírito permaneceu. Entre os gritos, os abraços, os cartazes e os olhos postos no céu, a noite da Covilhã provou que Abril está vivo na memória, na rua e nas novas gerações.

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