Conferência encerra dois anos de pesquisa sobre cinema autobiográfico realizado por mulheres

A última conferência do Speculum destaca a amplitude de temas a serem explorados sobre “o cinema autobiográfico realizado por mulheres, em Portugal e no Brasil” ao fim de dois anos de investigação.

O Auditório da Biblioteca da UBI acolheu convidados, investigadores e investigadoras de universidades nacionais e estrangeiras para o “Congresso Internacional Speculum: Cinema autobiográfico realizado por mulheres, em Portugal e no Brasil” realizado nos dias 21 e 22 de setembro.

A equipa multidisciplinar sintetizou os temas investigados no projeto “SPECULUM – Filmar-se e Ver-se ao Espelho: O uso da escrita de si por documentaristas de língua portuguesa” e apresentou “caminhos” a serem percorridos pelo grupo após o fim do projeto exploratório financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) desde outubro de 2021.

“Dois anos foram pouco para os mais de setenta filmes que recolhemos” aponta a responsável pelo projeto Speculum e docente na Faculdade de Artes e Letras da UBI, Ana Catarina Pereira. A equipa “está bastante motivada a continuar” e planeja “concorrer a projetos de investigação de maior dimensão e maior financiamento”, revela.

Em paralelo, o Speculum continuará a recolher e organizar o conhecimento científico produzido durante os últimos dois anos com a previsão de publicação de um livro, assume Ana Catarina Pereira.

“Há muitas coisas aqui que têm de ser trabalhadas, como o conceito de autorretrato, o conceito de autobiografia, o conceito de verdade, o conceito de documentário. E sobretudo, perceber este acto disruptivo e este acto de coragem de contar a própria história”, diz a investigadora.

Teresa Nunes, UBI, autora do artigo “Em defesa de Narciso: Superfície, verdade e liquidez em A Metamorfose dos Pássaros, de Catarina Vasconcelos” participa de mesa no Congresso Internacional Speculum.

O documentário autobiográfico realizado por mulheres é uma tendência mundial, mas está a acontecer muito em Portugal e no Brasil, segundo a investigadora. Contrariando a evidência histórica e universal de dificuldade para realizar filmes, mulheres documentaristas narram a própria história, numa escrita de si e na busca de definições próprias, com preocupações estéticas que inovam o género no “cuidado com o som, com a fotografia, com a maneira com que as imagens são trabalhadas”.

Além de Portugal e Brasil, o interesse pelo tema atraiu a professora Virgínia Espa, da Escuela de Arte de Huesca que proferiu a palestra “Una lectura autobiográfica del álbum de família”, seguida de mostra de trabalhos autobiográficos realizados por alunas da escola de arte. Durante o primeiro dia do congresso, Virginia Espa discutiu a formação da memória histórica a partir da sua experiência de recolha de fotografias pessoais e relação com a história da Guerra Civil da Espanha. 

Para Rita Capucho, co-Directora do Porto Femme – Festival Internacional de Cinema e investigadora do projeto Speculum, este congresso dialoga com os festivais ao dar visibilidade ao trabalho de auto representação das mulheres “para que as pessoas possam pensar e refletir”.

A autora da mesa “Autorepresentação projectada – Espaço íntimo e público no Porto Femme”, que aconteceu no segundo dia de Congresso, afirma que “um festival exibe em um grande ecrã os filmes autobiográficos e, com isso, as temáticas passam do espaço íntimo para o espaço público, crescem, transformam-se e lançam novas reflexões a partir dos reflexos dos espectadores.”

Assim como nos festivais, o Congresso Internacional Speculum exibiu o documentário autobiográfico Gipsofila, de Margarida Leitão  (2015), premiado em mais de vinte festivais. A realizadora e também investigadora do projeto Speculum, participou de uma conversa com Eduardo Paz Barroso (UFP/LabCom) após a exibição na qual cita a sua avó, personagem no documentário, para descrever Gipsofila como um “filme feito de ‘pequenos nadas”.

Trailer do documentário Gipsofila, dirigido por Margarida Leitão, Portugal (2015)

Margarida Leitão realizou o filme sem roteiros, contando com poucos equipamentos além da câmara, apenas de dia e na companhia de sua avó a fim de trabalhar o encontro entre elas. Durante a realização, houve “transmissões de afetos em vários níveis”, revelando “duas mulheres a enfrentar os seus fantasmas, os seus medos”, a avó com medo da morte e a neta com as azáfamas da vida, apontou a realizadora.

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