1O empreendedorismo é a saída profissional para muitos imigrantes recomeçarem a vida. Em Portugal, os brasileiros já são mais de 500 mil
Segundo o Alto Comissariado para as Migrações (ACM), 65% dos novos negócios em Portugal foram criados por cidadãos brasileiros. Iniciativas como esta mostram como o empreendedorismo pode ser um motor de transformação, tanto para quem procura recomeço, quanto para a comunidade local que recebe esses novos projetos.
É o caso de Marcus Leite, que trocou Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, pela cidade da Covilhã. Em janeiro deste ano, o gaúcho decidiu abrir a Tertúlia Livraria & Café, baseada na economia circular, a livraria é um espaço de aconchego, boas conversas e estudo.
Formado em Economia no Brasil, Marcus já escreveu para um jornal, trabalhou como contador e teve uma cervejaria artesanal. No entanto, em 2022, ele e sua família decidiram mudar de rumo em busca de novos horizontes, motivados tanto pelo desejo de aprimorar os estudos quanto pela busca por uma melhor qualidade de vida. A mudança para Portugal marcou um recomeço: o gaúcho escolheu a cidade da Covilhã como destino e iniciou o mestrado em Jornalismo na Universidade da Beira Interior (UBI). A decisão uniu o interesse pela comunicação, já presente em experiências anteriores, com a vontade de explorar novas possibilidades profissionais e pessoais em um ambiente mais tranquilo e propício ao crescimento.
Tertúlia: um ponto de encontro entre Brasil e Portugal
O logotipo da livraria foi pensado para traduzir visualmente o conceito por trás do espaço. A escolha pela escrita em letras minúsculas remete à ideia de um lugar pequeno e acolhedor; o ponto e vírgula simboliza uma pausa, enquanto a letra “U” remete à forma de uma cuia de chimarrão, ícone da cultura gaúcha.
“Tertúlia é uma palavra muito forte no folclore do Rio Grande do Sul, remete a uma música muito bonita. E, curiosamente, em Portugal este termo é muito utilizado para designar uma reunião de amigos para conversar sobre livros, literatura ou poesia”, conta Marcus.
Bruna Leite, filha de Marcus, é a parceira do pai no negócio. A estudante do 1º ano de Ciências da Comunicação (UBI), participa ativamente da gestão do espaço. Além das tarefas práticas, Bruna destaca-se pelo acolhimento aos frequentadores: “Quando eu entro na Tertúlia eu tenho o sentimento de estar em um ambiente sereno, que promove a tranquilidade. Além de proporcionar uma interação muito positiva, e quando posso estar com essas pessoas é muito bom.”
Os universitários são o grande público da livraria. Ana Gabriela Gomes, finalista em Arquitetura, vive na Covilhã há 5 anos e confessa que faltava este espaço na cidade: “É um espaço muito agradável que vai ser muito útil para os novos estudantes.”
Economia Circular na prática
No início deste ano, Fernando Rocha, doutorando em Ciências da Comunicação pela UBI, lançou o seu livro O Campeão da Vida – Perdoar para Viver. Segundo ele, seria muito difícil realizar esse lançamento em uma livraria tradicional, mas na Tertúlia encontrou oportunidade: “A economia circular aplicada a uma livraria é uma forma de democratizar o acesso à leitura”, afirma.
Para Fernando, esse modelo permite que os livros circulem por mais tempo, ganhem novas histórias com diferentes leitores e reduzam o desperdício, promovendo uma cultura de reaproveitamento e sustentabilidade.
Os livros vendidos chegam através de doações feitas pelos próprios leitores. Em vez de acumular ou descartar, as pessoas passam os livros adiante, e, com isso, reduzem o consumo e colaboram para a sustentabilidade. O livro mais barato na Tertúlia custa apenas 50 cêntimos, o mesmo preço do café – que também cumpre um papel essencial na manutenção do espaço.
Brasileiros que transformam ideias em projetos na Beira Interior
A Tertúlia Livraria & Café é um convite aberto a todos que acreditam na força da cultura. Como ressalta Marcus Leite, o mais importante é o respeito. “Temos livros aqui do Donald Trump, que estão ao lado do Manifesto Comunista. Assim, podemos dar um exemplo de que é possível conviver em paz”.
A livraria também representa um fenômeno cada vez mais comum na Covilhã, brasileiros que vêm estudar na Universidade da Beira Interior (UBI) e, ao se integrarem à cidade, decidem empreender e contribuir com novos olhares e iniciativas locais. Foi o caso de Marcus, que transformou sua paixão pelos livros e pela cultura em um projeto vivo, afetivo e sustentável.
Mais do que um negócio, a Tertúlia é um espaço onde ideias circulam livremente — tal como os livros, que passam de mão em mão, e as pessoas, que se encontram para conversar, ouvir música ou simplesmente fazer uma pausa com um café.
Por meio de parcerias com a CISMA – Associação Cultural e outros coletivos locais, a livraria promove eventos regulares, como rodas de conversa, lançamentos de livros e sessões de música ao vivo. A recente abertura da esplanada é apenas uma das iniciativas que sinalizam a vontade de crescer sem perder a essência. Todas as atividades, bem como as novidades do acervo, são divulgadas nas redes sociais da Tertúlia, mantendo a conexão com a comunidade.
